Entrevista com Zena Becker: “Para que Florianópolis tenha visão de sustentabilidade para o futuro é preciso ajustar o Plano Diretor”
É impossível olhar para o futuro de Florianópolis sem que a sociedade se junte e participe ativamente da construção de um futuro melhor. Essa é a visão de Zena Becker, coordenadora do Floripa Sustentável, movimento criado para trocar ideias e fomentar soluções eficazes para o desenvolvimento da cidade.
Para Zena, é fundamental revisar o atual Plano Diretor de Florianópolis e melhorar questões como a mobilidade, a infraestrutura e o saneamento básico da cidade, sem esquecer a inclusão social.
“A hora que você tem inclusão você tem desenvolvimento sustentável, porque tem desenvolvimento econômico, social e ambiental”.
Como tornar Florianópolis uma cidade mais sustentável?
Nós aprendemos a reagir e para que a gente continue sonhando com uma cidade sustentável, a sociedade precisa participar. Antes existia uma minoria que estava sempre contra algumas ações, principalmente de prefeitura, etc. Com essa reação, houve uma união muito grande da sociedade, poder público, iniciativa privada e sociedade civil. Isso faz com que exista uma sinergia de desenvolvimento integrado e automaticamente sustentável e principalmente inclusão. Quando você trabalha integrado você tem a inclusão de todos os segmentos e de toda uma população. O Floripa Sustentável tem como lema a prosperidade com inclusão social, temos trabalhado bastante com isso. Então a hora que você tem inclusão você tem desenvolvimento sustentável, porque tem desenvolvimento econômico, social e ambiental.
O Plano Diretor vai finalmente ser revisado?
O Plano Diretor é o que mais incomoda o Floripa Sustentável, porque entendemos que uma cidade precisa saber para onde ela quer ir, para onde ela vai crescer, de que forma ela deverá crescer e quem define isso é uma carta chamada Plano Diretor. Ela tem que mostrar a visão, como chegar lá e a distribuição adequada do solo. Uma das coisas que menos cresceu em Florianópolis foi a história do Plano Diretor, foi muito desgastante. O atual prefeito conseguiu aprovar de uma maneira não ideal, mas que já satisfez, apesar de todas as confusões, os imbróglios e as interferências do Ministério Público. Isso é um grande problema para a cidade. O poder público, a sociedade civil e a iniciativa privada têm acompanhado a revisão do atual plano, para que ele possa ficar de pé e dar condições para que a cidade volte a funcionar. Para que Florianópolis tenha visão de sustentabilidade para o futuro, o primeiro passo é ajustar o atual Plano Diretor e, em seguida, acabar com essa insegurança jurídica. Só cobrar, como era antigamente, isso não funciona, precisamos ajudar também. Temos muito o que evoluir ainda, mas nós vivemos um momento muito especial. Reagir cada vez mais. O que não está certo tem que cobrar, tem que exigir, tem que ir junto quando for preciso.
Para mim, a mobilidade e a infraestrutura são os grandes desafios. Até porque moramos em uma cidade que geograficamente é muito complicada.”
Quais são os maiores desafios da Capital?
Para mim, a mobilidade e a infraestrutura são os grandes desafios. Até porque moramos em uma cidade que geograficamente é muito complicada, isso também incomoda um pouco para quem está fazendo os planos. Precisamos educar nossos alunos para que eles entendam a importância de um turista aqui em Florianópolis, quando um turista vem, quantas crianças podem ir para uma escola porque ele deixou recursos aqui. Temos que melhorar nossos produtos turísticos, principalmente os nossos equipamentos, nosso Centro de Eventos precisa urgentemente de melhorias, uma política mais adequada para o desenvolvimento da tecnologia. Se queremos ser uma cidade tecnológica e uma cidade turística, nós precisamos entender melhor, porque a tecnologia passa por um grave problema, que é a falta de mão de obra e de melhorias na infraestrutura, inclusive de dados, de energia.
Como solucionar estes problemas?
Capacitação para que tenhamos mão de obra suficiente, porém quando a gente diz isso, esbarra num grande problema em Florianópolis que é a falta de moradia popular. Precisamos que o poder público, principalmente o município, tenha urgentemente uma política de incentivo à construção de moradias populares. Estamos perdendo muitos talentos porque é natural que uma cidade como Florianópolis, onde o custo de moradia é muito alto, se não tiver um incentivo ao empresário, teremos problemas graves no futuro de moradia popular. E automaticamente mão de obra. Se a pessoa não tem como morar, ela não vai querer trabalhar em Florianópolis.
Qual o caminho para melhorar a mobilidade urbana?
Primeiro as pessoas precisam se conscientizar. A mobilidade não se resolve com uma grande linha de transporte público, mobilidade é primeiro planejamento e uso adequado do solo. Para isso eu preciso do Plano Diretor, pois nesse planejamento eu preciso definir as centralidades que hoje já são bem claras em Florianópolis. Mas essas centralidades precisam de infraestrutura e de transporte adequado. O que é o transporte adequado? Ciclovia, transportes menores, pois quando você tem um eixo como é a SC-401 não tem porque entrar em Santo Antônio um ônibus enorme que fica trancando tudo. Pode entrar os micro-ônibus e tem que ter calçadas largas, ciclovia e junto o transporte marítimo. Nós temos diversas ações na mobilidade que precisam ser tomadas decisões. Outra coisa importante, moramos numa região metropolitana, se não fizer uma licitação para o transporte integrado da região metropolitana, que vai diminuir o custo da passagem, as pessoas não vão andar de ônibus. Andar de ônibus é muito caro, é mais barato vir de carro. Eu participei de uma grande reunião que organizamos no Floripa Sustentável com a Secretaria de Infraestrutura, com a proposta da iniciativa privada, o pessoal do transporte coletivo mostrou que é fácil fazer integração. Nós aprendemos a reagir e para que a gente continue sonhando com uma cidade sustentável, a sociedade precisa participar.”
Quais os pontos mais graves do saneamento básico de Florianópolis?
Temos um problema grave de esgoto e de drenagem. Não temos um projeto de drenagem e tudo isso está dentro do pacote do saneamento. São os resíduos, as drenagens, abastecimento e o esgoto. O resíduo, eu diria que tem uma política boa, tem que melhorar muito, mas já tem uma política boa. O saneamento tem uma péssima política, hoje existe quase 60% de área coberta com rede de esgoto. Porém, em muitos lugares onde tem rede de esgoto, não tem estação de tratamento, como é o caso do Sul da Ilha. Onde tem uma boa estação de tratamento, a população não está ligando na rede, como é o caso do Norte da Ilha, e assim por diante. É um grave problema, inclusive de saúde pública. Existe um problema, na verdade, de responsabilidade da Casan porque ela é contratada para isso, só que quando você contrata um serviço, você não cobra o serviço? Tem que cobrar. A prefeitura paga a conta, então ela tem que cobrar de quem ela está pagando. É exatamente isso, é muito fácil. Se a pessoa não entregou o serviço adequado, tens uma alternativa, termina o contrato.
Entrevista publicada no jornal Notícias do Dia, 17 de agosto de 2021